Corrupção é assunto em todas as conversas
Diário da Manhã
Publicado em 17 de abril de 2018 às 02:34 | Atualizado há 4 meses
A corrupção está em destaque não só na mídia brasileira e internacional, mas também nas conversas dos cidadãos, seja na escola, família, igreja ou em uma mesa de bar. Com uma série de escândalos envolvendo políticos e empresários que estão sendo presos por crimes relacionados, o tema fica cada vez mais evidente e surge a questão: de onde vem a corrupção?
Conforme o dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, a palavra corrupção significa deterioração, decomposição física, orgânica de algo ou putrefação; modificação, adulteração das características originais de algo. Em sentido figurado, a palavra pode significar a degradação dos valores morais, hábitos ou costumes. Etimologicamente, o termo corrupção surgiu a partir do latim corruptus, que significa o “ato de quebrar aos pedaços”, ou seja, decompor e deteriorar algo.
A corrupção existe desde a Grécia Antiga, quando Aristóteles se dedicou em analisar as causas da corrupção naquele tempo, notadamente no que tange à corrupção dos magistrados. Para ele “(…) é evidente que o excesso e a ambição de bens materiais são a principal origem das revoltas políticas. Com efeito, muitas vezes, elas nascem devido à prepotência dos magistrados que abusam dos cargos por ser demasiado ambiciosos, sublevando-se uns contra os outros, ou contra o regime que lhes concedeu a autoridade. Na verdade, a ambição desmedida dos magistrados deriva algumas vezes das riquezas privadas, outras do erário”.
Para os estudiosos, uma série de fatores contribuem para a corrupção como a elevada burocracia, que reduz a eficiência da administração pública; um sistema judiciário lento e pouco eficiente; além de um elevado poder discricionário do Estado na implementação e condução de políticas; e salários inferiores no setor público, em relação ao setor privado.
CORRUPÇÃO NO BRASIL
No Brasil, a corrupção existe desde os tempos da colonização do País. Conforme a historiadora Adriana Romeiro, que é doutora em história pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), o conceito de corrupção entre os séculos 16 e 18 era muito mais abrangente e também incluía questões morais e religiosas. “Descobri que não só já havia o conceito de corrupção como também englobava práticas que hoje associamos a isso, como tráfico de influência, nepotismo, favorecimento e abuso de autoridade. As práticas que vemos hoje na política brasileira já remontam ao século 16”, revelou a historiadora em entrevista ao jornal Estado de Minas.
A historiadora destaca que uma das razões para o início da corrupção no Brasil era a distância de Portugal, além da questão da escravidão. “Por estar longe do centro político, a vigilância era muito frágil e precária. É preciso lembrar que o Brasil sempre foi a terra de oportunidades. O Brasil também foi até recentemente um País escravocrata. Para manter uma instituição como a escravidão por tanto tempo, é preciso que você não tenha o menor escrúpulo moral em relação ao outro”, ressalta.
Adriana revela que a impunidade em relação a casos de corrupção no Brasil dos séculos 16 a 18 estava prevista em lei e era um privilégio concedido pelo rei. “Casos em que investigar e punir alguém pudesse ser algo tão catastrófico, que poderia prejudicar o bem comum, era preferível fazer vistas grossas. As elites locais prestavam serviços aos reis, participavam da obra de colonização, abriam estradas, faziam o comércio funcionar. Em troca desse serviço, ganharam o direito da impunidade. O contrabando foi, de longe, a prática ilícita mais comum no Brasil. O rei sabia, as autoridades envolvidas na repressão ao contrabando, praticavam contrabando, as elites lucravam muito e o rei fazia vistas grossas. Havia um abismo entre a norma e a prática”, conclui.
TEORIAS
Para o estudioso Robert Klitgaard, sobre a corrupção é uma questão de crime de cálculo e não de paixão. “Tal comportamento derivaria menos da falta de princípios éticos ou morais e mais das condições materiais propícias para a ocorrência do crime. De acordo com essa teoria, a corrupção envolve principalmente três variáveis: a oportunidade para ocorrer o ato ilegal, a chance de a ação corrupta ser descoberta e a probabilidade do autor ser punido”, afirma.
O jurista José Murilo de Carvalho destaca que entre as inúmeras razões que agravaram a corrupção no Brasil estão o crescimento da máquina estatal, com um excesso de burocracia, o que amplia as oportunidades para o exercício de práticas clientelistas e patrimonialistas. Outra razão apontada foi a ditadura militar, “que protegeu com o arbítrio a atuação dos governantes”, além da construção de Brasília, “que libertou os políticos do controle das ruas, ampliando a sensação de impunidade”, ressalta.
Operação Mãos Limpas inspirou Lava Jato
A Operação Mãos Limpas, realizada na Itália entre 1992 e 1996, investigou mais de seis mil pessoas– empresários, administradores, parlamentares e ex-primeiros ministros – revelando um mecanismo de propinas entre empresários e partidos sobre as licitações de grandes obras públicas que garantiram a industrialização da Itália como sétima potência mundial na década de 1980.
MÃOS LIMPAS
Inspirada na Mãos Limpas, a Operação Lava Jato – que iniciou em 2014 – é a maior investigação sobre corrupção conduzida no Brasil até hoje. Inicialmente, a Lava Jato apurava redes operadas por doleiros que praticavam crimes financeiros com recursos públicos. Com o avançar das investigações, a operação descobriu a existência de um enorme esquema de corrupção em empresas públicas, como Petrobras, envolvendo diversos partidos políticos e empresas privadas, especialmente, empreiteiras. Conforme o Ministério Público Federal (MPF), mais de 1.500 procedimentos foram instaurados, com cerca de 100 prisões preventivas e mais de 100 prisões temporárias, além de mais de 200 conduções coercitivas e cerca de 800 mandados de buscas e apreensões.
Lei anticorrupção: avanço na responsabilização de empresas
Aprovada em 2014, a Lei nº 12.846/2013 – conhecida como Lei Anticorrupção, representou um grande avanço ao prever a responsabilização objetiva, no âmbito civil e administrativo, de empresas que praticam atos lesivos e criminosos de corrupção, independentemente da vontade das pessoas que a integram, contra a administração pública nacional ou estrangeira. O Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU) é responsável grande parte dos procedimentos como instauração e julgamento dos processos administrativos de responsabilização e celebração dos acordos de leniência no âmbito do Poder Executivo Federal.
Apesar da legislação ser voltada para empresa, o juiz substituto do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, Anderson Ricardo Fogaça, acredita que a lei pode atingir partidos políticos.
JURISPRUDÊNCIA
“Embora a lei não inclua expressamente os partidos políticos entre as pessoas jurídicas que praticarem atos contra a administração pública, entendo que a jurisprudência deverá caminhar pela sua aplicação a tais entes por se tratar de associações civis, que visam assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal”. A lei foi sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff (PT) como uma resposta à população brasileira após as manifestações de 2013.