Cotidiano

Morte de bebê indígena por desnutrição em MT gera cobrança ao governo Lula

DM Online

Publicado em 22 de maio de 2025 às 14:10 | Atualizado há 7 horas

As mortes de um bebê por desnutrição, de uma grávida por problemas respiratórios e de uma jovem de apendicite entre março e maio deste ano na Terra Indígena Marãiwatsédé, em Mato Grosso, geraram cobranças de indigenistas à Funai (Fundação Nacional dos Povo Indígenas), órgão do governo federal, em carta enviada na última sexta-feira (16).
No documento, também endereçado à Sesai (Secretaria de Saúde Indígena) e ao Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena), ligados ao Ministério da Saúde, a organização indigenista Opan (Operação Amazônia Nativa) afirmou que as mortes ocorreram por causas evitáveis e que doenças respiratórias e casos de desnutrição infantil estão cada vez mais comuns em Marãiwatsédé, território do povo xavante.
Procurado, o Ministério da Saúde diz que reforçou o atendimento médico no território indígena e que aumentou o repasse de recursos ao Dsei Xavante, que atende a área.
A Funai não se manifestou. O MPF (Ministério Público Federal) em Mato Grosso informou “ter recebido a denúncia da Opan sobre o caso no 2º Ofício de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais”, mas não deu detalhes de qual procedimento adotará.
O bebê São Damião Pariwa’a, neto da cacica Carolina Rewaptu e do cacique geral Damião Paridzané, tinha 1 ano e 4 meses quando morreu por desnutrição, no dia 30 de abril deste ano. O ministério diz que a família recusou, em primeiro momento, proposta de remoção dele para outra unidade de saúde. Houve piora no quadro, e a transferência foi aceita quando não havia tempo hábil para reverter o quadro, afirma a pasta.
Tania Penape, 22, morreu por apendicite no dia 11 de maio, e Eunice Penhidzari, 36, no dia 4 de abril, acometida por síndrome respiratória aguda grave durante a gestação.
Dentro da terra indígena há uma Unidade Básica de Saúde com um médico, enfermeiros e outros profissionais, mas no local não existem viaturas para atendimento da comunidade indígena, o que dificulta o deslocamento às 21 aldeias que ficam dentro do território. Muitas delas ficam a mais de 70 quilômetros de distância da aldeia central, onde está a unidade de saúde.
“A viatura que existe no posto de saúde está quebrada”, relata o indigenista Marcelo Sanches Okimoto. “O posto de saúde fica na aldeia central, até o ano passado ainda existia viatura, mas agora não tem mais, então estamos bastante preocupados com relação a isso”, declarou Okimoto.
O líder indígena Cosme Rite é morador de Marãiwatsédé e cobra das autoridades a construção de um segundo posto de saúde. Cosme perdeu o irmão, Elidio Tsorone, por câncer no início de maio.
“Nós estamos passando uma situação que está piorando a nossa saúde”, afirma Cosme. “E não é só falta de transporte, é falta de acompanhamento também, lá dentro o pessoal é contratado para cuidar da base, mas falta assistência, exemplo é meu irmão que partiu, no caso dele a doença era grave”, diz o líder indígena.
Sem viatura para o transporte de pacientes para hospitais próximos, os profissionais recorrem a pedidos de carona.
O indigenista Marcelo Okimoto conta que há duas semanas os profissionais da unidade de saúde indígena pediram carona para colaboradores da Opan levarem uma paciente para Água Boa (615 Km de Cuiabá), cidade que possui um hospital estadual com leitos de Unidade de Tratamento Intensivo (UTI).
Na carta em que denunciou os problemas, a Opan chamou atenção sobre a ausência de um coordenador do Dsei Xavante.
Segundo a Opan, alguns dos problemas de saúde também podem ser explicados por mudanças no hábito alimentar devido às alterações no território. Em 1966, os xavantes foram retirados de Marãiwatsédé e conseguiram retornar apenas em 2013. No retorno, encontraram 70% da vegetação nativa desmatada, o que prejudicou o acesso aos alimentos antes encontrados de forma abundante.
“O hábito alimentar deles mudou, nós passamos por isso, e eles estão começando a agora a experimentar alimentos que não são alimentos, como salgadinhos e refrigerantes”, diz Okimoto. “Além disso, quando o povo xavante voltou a terra estava devastada, eles não têm mais a terra que deixaram”, diz Marcelo.
O Ministério da Saúde afirma, em nota, que aumentou em 71% os recursos repassados a indígenas do Território Marãiwatsédé, passando de R$ 46 milhões, em 2022, para R$ 79 milhões, em 2024. Além disso, a pasta diz ter contratado 74 novos profissionais desde 2023, totalizando atualmente 641 trabalhadores da saúde.
A pasta do governo Lula (PT) afirma ainda que desenvolve ações voltadas para a suplementação alimentar infantil e para a prevenção de doenças respiratórias, com a vacinação.
“A recuperação nutricional em crianças é um processo lento que pode levar anos até a normalização do peso e fortalecimento do sistema imunológico”, afirma o ministério.
Em 2023, uma crise de saúde indígena ganhou projeção nacional, mas em Roraima. O Ministério da Saúde decretou estado de emergência para combater a falta de assistência sanitária que atingiu o povo yanomami. Foram registrados casos de desnutrição e insegurança alimentar, principalmente entre as mais de 5.000 crianças da região.
Em 2024, o ministério registrou 33,3 mil casos de malária na Terra Indígena Yanomami, uma quantidade superior à própria população do território –são 27,1 mil indígenas na região, segundo dados do Censo de 2022 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

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