PL faz nova proposta para anistia ao 8/1 com brecha para Bolsonaro
Redação Diário da Manhã
Publicado em 23 de maio de 2025 às 05:46 | Atualizado há 13 horas
Marianna Holanda – Folha Press
O PL apresentou nesta quinta-feira (22) um novo texto para o projeto de lei que concede anistia aos condenados nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023. A versão é mais restrita que a anterior, mas, de acordo com técnicos ouvidos pela reportagem, deixa brecha que pode beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e demais réus acusados de liderar a trama golpista.
O texto prevê o benefício apenas para os crimes contra o Estado democrático de Direito às “pessoas físicas que tenham participado diretamente de manifestações ocorridas no dia 8 de janeiro de 2023, em Brasília, que resultaram na depredação de patrimônio público e privado”.
Ainda que o PL já tivesse o aval de Bolsonaro para mexer no texto aprovado na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara dos Deputados no ano passado, esta é a primeira vez que uma nova versão é apresentada publicamente. A anterior previa anistia geral do período do 8 de Janeiro até a promulgação da lei.
O texto dizia que o benefício seria concedido “a todos que participaram de manifestações com motivação política e/ou eleitoral, ou as apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas”.
Técnicos da Casa dizem, reservadamente, que o novo documento mantém brecha que pode beneficiar Bolsonaro. Eles afirmam que, juridicamente, não existe a figura de “participante direto”, mas sim autor (quem executa) e partícipe (presta auxílio) de um crime. O texto ficou ambíguo da forma como está, segundo eles.
O advogado e professor de direito penal da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) Frederico Horta teve o mesmo entendimento, sobretudo pelo trecho que trata dos que tenham participado diretamente dos atos. “A lei brasileira não conhece essa distinção. Ela responsabiliza pelo crime todos aqueles que de qualquer forma contribuíram para o crime. Toda contribuição pessoal é uma contribuição direta”, disse.
“Se a lei falasse nos executores dos atentados de 8 de janeiro, ressalvando a responsabilidade dos instigadores, dos financiadores, de quem por ação ou omissão contribuiu, aí seria seguro que não aproveitaria o Bolsonaro. Mas do jeito que está, aproveita todo mundo que participou.”
O advogado criminalista João Marcos Braga, por sua vez, avalia que o texto é de fato mais restritivo que o anterior, o que dificultaria a defesa dos réus, caso quisessem se beneficiar com a legislação. “Não abarcaria, na minha visão, eventuais pessoas que estivessem por trás do 8 de janeiro. Me parece ser mais restritivo mesmo. Torna mais difícil uma argumentação para a defesa, no sentido de tornar aplicável a ele [Bolsonaro]”, afirmou.
O ex-presidente está sendo acusado de liderar a trama golpista, ainda que não estivesse presente em Brasília no dia dos ataques golpistas -ele estava nos Estados Unidos. O texto ainda não entrou no sistema, mas foi distribuído para jornalistas pela equipe do líder do partido, Sóstenes Cavalcante (RJ). Nesta semana, ele foi cobrado na reunião de líderes a apresentar uma nova proposta, porque não haveria consenso em torno do texto anterior -que concedia anistia ampla, geral e irrestrita.
O líder do PL nega que o texto possa beneficiar Bolsonaro e demais réus. “Está claro que ele e outros réus não estão contemplados. Não tem nada especificando os casos deles”, disse. Questionado se o ex-presidente teria dado aval ao projeto, Sóstenes disse que Bolsonaro não viu esta última versão, mas aprovaria. “Como estou falando com ele sempre [sobre o texto], tenho certeza que não teria objeção. Ele nunca esteve [contemplado] no texto nosso, sempre falou isso”, disse.
Um grupo de deputados do PL participou de reunião de líderes na última terça-feira (20) para cobrar o presidente da Câmara, Hugo Motta, a pautar o projeto da anistia -que já tem assinaturas necessárias para urgência, quando o texto é analisado diretamente no plenário. Mas os líderes decidiram, há algumas semanas, não levar adiante o projeto.
O presidente da Câmara disse a deputados, durante a reunião de líderes na terça, que não há consenso na Casa sobre anistia ampla para os presos e condenados nos ataques golpistas do 8 de Janeiro. O texto não passará na força, afirmou ainda. A fala foi em resposta ao deputado Nikolas Ferreira (PL-MG). Com outros integrantes da oposição, ele participou da reunião para cobrar o presidente da Casa sobre anistia e CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) do INSS.
Sobre a comissão, o debate foi mais rápido, e Motta citou a questão regimental, de que há outros requerimentos a fila. A discussão esquentou quando passou para anistia. De acordo com pessoas que participaram da reunião, Nikolas pediu a Motta um posicionamento público sobre o tema, relembrando que na sala dele estiveram os seis filhos de um fugitivo do 8 de Janeiro há poucos meses.