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OPINIÃO

Riscos e abusos da “administração da visibilidade”

A administração da visibilidade através da mídia é uma atividade perseguida não somente nos períodos intensivos de campanhas eleitorais; ela faz parte também da própria arte de governar. A condução de um governo exige um contínuo processo de tomadas de decisões sobre o que, a quem e como pode se tornar público. John B. Thompson.

Reza a lenda que quando o candidato republicano Richard Nixon debateu em cadeia nacional de TV e Rádio, com o candidato John Kennedy, ele estava com a barba por fazer. Esse foi o primeiro debate presidencial televisionado nos EUA. A lenda diz ainda que seu perfil contrastava com o do rival circunspecto, cujo rosto límpido e luminoso transmitia uma imagem mais serena, o que somente os telespectadores tiveram condições de avaliar. Nixon perdeu as eleições em 1960, mas aprendeu a lição do jogo: deveria criar uma nova imagem de si.

Na eleição de 1968, o então candidato, segundo John B. Thompson (1995) em A Mídia e a Modernidade: uma teoria social da mídia, tinha a seu favor uma equipe especializada em comunicação, responsável por produzir spots comerciais que engendravam um líder estadista capaz de se comunicar com o povo. Isso serviu, segundo o autor, como um contrapeso aos limites do presidenciável, expostos nas suas entrevistas aos jornalistas daquele país e explorados negativamente. Nixon ganhou as eleições e se reelegeu em 1972. Entretanto, o presidente renunciou ao poder dois anos depois quando seu nome foi arrolado no famoso caso de espionagem política do Comitê do Partido Republicano de Washington DC, na ocasião da última corrida eleitoral. O episódio ficou conhecido como Caso Watergate.

Em nenhuma sociedade a publicidade política foi tão usada como na nossa. Ela heroifica sujeitos, os torna salvadores da pátria e, como é regra, os faz condutores da modernidade e de um suposto tempo novo que, muitas das vezes, é só a velha forma de fazer política com uma cara mais jovial e límpida. Por outro lado, os opositores fazem o uso da mesma estratégia para diluir o capital político do rival. Na seara da publicidade política, a mídia, que não se resume ao duelo quase sempre maniqueísta, diga-se, pode se prestar a essas duas funções: a feitura de líderes estadistas e a demonização dos mesmos. É por isso que qualquer grupo que aspira ao poder ou que está nele precisa de uma base midiática na qual os profissionais devem ser capazes de produzir publicidade positiva, sendo o avesso dessa aquilo que os opositores fazem. Hoje, as redes sociais são os meios fundamentais para a publicidade política.

Se o cultivo da imagem é, de fato, parte da “arte de governar”, ele não pode extenuar os limites do bom senso e, o que é pior, daquilo que os cidadãos gastam por meio de seus impostos. O gasto excessivo com a propaganda, independentemente de partidos ou governos, cobra seu preço principalmente quando aspectos vitais da manutenção de serviços básicos estão sob ameaça. Nenhuma reforma política ou de contenção de gastos acontecerá de verdade se a torneira da publicidade não for fechada.

No atual momento, o governo de Goiás vem executando uma desagradável política de parcelamento de salários do serviço público, com o discurso de que a crise econômica afeta os cofres do estado e o obriga a um ajuste das contas. Ao mesmo tempo, ninguém tem acesso ao orçamento disponível para a produção de publicidade do mandato em exercício. Mas uma informação preocupante podemos invocar para entender a recusa do governo em disponibilizar os gastos com publicidade: segundo o Tribunal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO), que apresenta dados ainda por totalizar, o atual governador gastou quase meio bilhão com publicidade no mandato passado. Foram exatamente R$ 448 milhões, segundo os números do Portal de Informação do Cidadão do TCE-GO.

Diante da recusa em disponibilizar os gastos com publicidade deste ano, ficamos inseguros quanto às prioridades do governo, sobretudo quando o funcionalismo público é quem está sofrendo as consequências do descontrole da gestão anterior do estado e da suposta necessidade de ajuste das contas públicas estaduais. Seria salutar sabermos qual o volume gasto com publicidade, até porque esse gesto de transparência, comprovando-se o baixo investimento em propaganda e publicidade, atenuaria a onda de mal-estar e descrença já avançada entre servidores e governo.

Na UEG, por conta do tal ajuste, funcionários mais graduados tiveram que engolir um estrambólico mês de 40 dias, uma vez que receberam seus salários de julho com dez dias de atraso. Segundo informações que circulam pela imprensa goiana, esses servidores continuarão a receber seus proventos apenas no dia dez de cada mês. É difícil para o servidor público, que já contabiliza perdas com a inflação, ter que lidar com juros altíssimos de contas atrasadas, em razão de um ajuste financeiro que não sabe ao certo se tem motivação real e, caso tenha, em nenhum momento contribuiu para a sua existência.

(Alan Oliveira Machado, professor do Curso de Letras, na UEG, Campus de Iporá, doutorando em Educação pela UFG / João Paulo P. Silveira, professor do Curso de História, na UEG, Campus de Iporá, doutorando em Sociologia pela UFG)

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