Opinião

BNDES volta à cena

Redação DM

Publicado em 15 de junho de 2017 às 02:17 | Atualizado há 8 anos

Sem querer ser profeta, geralmente quando analiso um fato, o leitor pode anotar para conferir depois, porque costumo me basear em evidências incontestáveis.

No longínquo 09/02/2015, publiquei neste mesmo espaço o artigo “BNDES: um escândalo gigantesco (o “petrolão” é apenas gorjeta)”, antevendo que os financiamentos daquele banco iriam mostrar um escândalo que poria no chinelo o “mensalão”, o “petrolão” e outros escândalos que surgem a cada hora neste nosso Brasil sem conserto.

Disse eu, há mais de dois anos, que o principal objetivo do BNDES era financiar a longo prazo a realização de investimentos em todos os segmentos da economia, de âmbito social, regional e ambiental e apoiar empreendimentos que contribuam para o desenvolvimento do Brasil, para resultar na melhoria da competitividade da economia brasileira e a elevação da qualidade de vida da sua população. Mas foi legalmente desvirtuado.

Fundado, em 1952 e integrante da administração pública indireta e vinculado ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, foi criado como um órgão de fomento no contexto do desenvolvimento econômico no Brasil.

Entretanto, no ano de 2007, um decreto deu nova configuração às atribuições desse banco: acrescentou-se uma expressão que veio dar uma guinada maléfica no que gerou um manancial de escândalos e criou uma espécie de corrupção de largo espectro, ao dispor que os financiamentos poderiam ser liberados não só para empresas brasileiras no território nacional, mas também no exterior.

Assim, saíram aos borbotões generosos financiamentos para empresas brasileiras no exterior, significando que, assim, o BNDES passou a estimular o progresso em outros países, criando empregos e fazendo crescer a oferta de mão-de-obra, enquanto no Brasil o desemprego avançava.

O citado artigo, inobstante publicado há 28 meses, vem sempre sendo lembrado através de comentários e-mails. Os empréstimos concedidos ao exterior, mascarados em financiamentos a multinacionais brasileiras, serviram para levar nosso dinheiro para obras realizadas pela Odebrecht em Cuba,  no Equador,  no Panamá, na Argentina, na Venezuela e em Moçambique. A OAS foi contemplada com milhões de dólares para obras na Argentina; a Andrade Gutiérrez fez obras milionárias em Moçambique. E assim, aparecem outras empreiteiras, como a Queiroz Galvão, com obras na Nicarágua, na Bolívia, no Peru e no Uruguai.

Esses empréstimos financiam atividades de empresas brasileiras no exterior, que, até bem pouco tempo, eram “segredo de Estado”, pois foram consideradas secretas pelo banco (o que já dava a impressão de “maracutaia”, para usar um vocábulo inventado por Lula, quando era oposição). Mas no início do segundo semestre de 2014, o Ministério Público Federal acionou a Justiça para liberar tais informações. E a juíza federal Adverci Mendes de Abreu, da 20.ª Vara Federal de Brasília, considerou que a divulgação dos dados de operações com empresas privadas “não viola os princípios que garantem o sigilo fiscal e bancário” dos envolvidos (e a ilustre magistrada vem incomodando com suas decisões: foi ela quem mandou deportar o terrorista Cesare Battisti, que Lula aninhara no Brasil, desafiando o Supremo).

Esses “empréstimos”, liberados “a toque de caixa” pelo então presidente do BNDES Guido Mantega, encobriam as famosas palestras que, a peso de ouro, o ex-presidente afirmava ter feito no exterior, “coincidentemente” nos países para onde haviam sido liberados recursos para as obras.

A partir da decisão da juíza, o BNDES está obrigado a fornecer dados solicitados pelo Tribunal de Contas da União, o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União (CGU). E aí é que a coisa começou a ganhar uma dimensão que até então era sequer imaginada: descobriu-se que o BNDES concedera mais de 3.000 empréstimos para a construção de usinas, portos, rodovias e aeroportos no exterior.

Agora, o caso da JBS escancarou as portas para que o povo avalie a extensão: o BNDES financiou o estratosférico progresso da multinacional de carnes, ao se saber que 80% de suas atividades são desenvolvidas no exterior, e apenas 20% ficam no Brasil. Em suma, o BNDES, sob pretexto de incrementar o desenvolvimento de empresas brasileiras, encobriu uma série de falcatruas, como o financiamento de quase dois mil políticos de vinte e oito partidos, que, regiamente comprados, garantiam à JBS um aumento em seu crescimento, ainda não visto nem nas mais sólidas multinacionais.

E o saldo dessa multinacional revela-se prejudicial ao Brasil: levantamento recente mostra que existem na Justiça do Trabalho mais de 34 mil ações trabalhistas contra a JBS.

Mas a caixa preta do banco começa a ser aberta: o ministro Augusto Sherman, do Tribunal de Contas da União, em despacho interno, denuncia uma tentativa de desmantelamento de sua equipe, que investiga contratos do BNDES. O foco da investigação são os contratos com os “gigantes nacionais do governo Lula”. O ministro relaciona algumas investigações em andamento, entre as quais, destaca-se o processo TC 007.481/2014-4, que procura saber o destino dado pelo Banco, por meio de suas operações, a um montante de capital que supera R$ 1,2 trilhão nos últimos 15 anos.

Esses mais de um trilhão de reais, tirados de nossos impostos e subtraídos de obras para a educação, saúde, segurança, saneamento básico e outros melhoramentos, “viraram alcanfor”, no sábio dizer do nosso sertanejo.

 

(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa (AGI), escritor, jurista, historiador e advogado, [email protected])

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